terça-feira, 27 de maio de 2014

O pastorzinho mentiroso


Um jovem pastorzinho cumpria diariamente o trabalho que recebera do pai: levava seu rebanho para se alimentar nas montanhas. Era assim todas as manhãs e todas as tardes.
Sentindo-se enfadado pela rotina, pois nada de novo ou emocionante acontecia no pastoreio, resolveu gritar por socorro, que os lobos estavam atacando seu rebanho.
Assustados com o grito, alguns moradores de seu vilarejo correram para acudir e, quando chegaram, não havia nenhum sinal de perigo. Apenas o travesso pastorzinho, às gargalhadas, que se divertia por ver o semblante de decepção dos que foram para socorrê-lo.
No dia seguinte, deu-se semelhante ocorrido: gritou o pastorzinho, correram os moradores e nada de lobos. O rebanho pastava tranquilamente. E, para a alegria do menino, todos, mais uma vez, se decepcionaram.
Vai que pela terceira vez, ouviu-se da aldeia berros estranhos que vinham das montanhas, mas as pessoas já estavam acostumadas com a cena do pastor e decidiram não cair mais uma vez em suas lorotas.
Voltou para casa o pastor sem o rebanho. Sozinho, não pôde afastar o perigo. Suas ovelhas foram devoradas por um bando de lobos famintos.


Moral: A mentira destrói a confiança.


Fábula de Esopo recontada por Marcos Morelli

quarta-feira, 7 de maio de 2014

O jabuti e o chacal

Os griôs são sábios contadores de histórias que, por meio da tradição oral, ajudam a preservar a cultura africana. A fábula recontada a seguir é um exemplo do que os griôs contam. Em muitas dessas histórias, os animais  possuem virtudes e defeitos, assim como os seres humanos. O jabuti e o chacal protagonizam essa narrativa de disputa para conquistar a mão de uma princesa muito bela. Veja só como humanos e animais convivem normalmente, dividindo o mesmo espaço. 





A filha de um rei muito admirado em uma aldeia africana já estava chegando perto da idade de se casar. Sua pele negra e brilhosa como uma jabuticaba madura encantava a todos da aldeia e das regiões mais próximas.
Sendo o rei muito sábio, não entregaria a mão de sua filha a qualquer um. Decidiu então que nada mais nada menos que o mais bravo e valente pretendente é que seria o felizardo noivo da princesa.
Depois de muitos dias de desafios e provas de muita coragem e inteligência, restaram dois finalistas: o jabuti e o chacal.
O jabuti já foi logo mostrando muita inteligência e ousadia antes mesmo da prova decisiva. Quando o rei já não tinha mais ideias para o último desafio, o primo da tartaruga veio com suas conversas moles e sugeriu que o vencedor poderia ser aquele que fosse capaz de comer uma papa de milho muito quente.
O rei gostou da ideia. O chacal deu uma coçadinha na cabeça, meio confuso e assustado ao mesmo tempo, mas acabou concordando. Tudo acertado e, no outro dia, todos conheceriam o futuro marido da bela princesa.
Na manhã seguinte, desde os primeiros raios de sol, já se podia ver e ouvir por toda a aldeia uma movimentação alvoroçada. Homens, mulheres, crianças e animais, aos poucos, formavam um grande círculo em torno do caldeirão cheio de papa de milho que havia sido colocado no fogo desde a noite anterior. Uns apostavam no jabuti, já outros tinham certeza que o vitorioso seria o chacal. Imagine como estava o coração da princesa e a curiosidade do rei para saber quem se tornaria o mais novo membro da família real!
O som dos atabaques, acompanhado por cantos e danças, anunciava que era chegado o tão esperado momento. Quando então o barulho foi interrompido pelo brado do rei:
- Quem deseja ser o primeiro a mostrar sua coragem e valentia?
Os dois competidores se entreolharam, e o jabuti quebrou o silêncio:
- Eu aceito ser o primeiro!
Tranquilamente, pegou a tigela de barro das mãos do cozinheiro e com sua voz confiante anunciou:
- Para que todos comprovem que esta papa está realmente muito quente, vou mostrá-la para cada um de vocês.
Sem que ninguém desconfiasse de sua astúcia, passou vagarosamente a tigela fumegante perto de cada um que estava no círculo querendo saber o resultado. A papa estava tão quente que até saía fumaça. Depois de completar uma demorada volta no imenso círculo, a papa já estava morna e o jabuti pôde comê-la de uma vez, ouvindo os suspiros de espanto de todos. Após a última engolida, o som dos atabaques, misturaram-se aos sons dos aplausos, e o grande feito foi alegremente comemorado.
O chacal sabia que o desafio havia se tornado ainda mais difícil. Cessaram-se os ruídos e o canino recebeu a tigela fumegante das mãos do cozinheiro, mas de tanto tremer, deixou-a cair em suas patas, queimando-as com a papa borbulhante. Não suportando a dor e a vergonha, fugiu para longe, pulando nas pontas dos pés. Ao som de uma música muito alegre, a aldeia festejou a conquista do jabuti, que mostrou mais uma vez que a vitória nem sempre é do mais valente, mas sim do mais sábio.



Fábula de tradição oral africana, recontada por Marcos Morelli